Calcule seu felicitômetro
O que se esperar de uma sociedade em que tudo é programado para não durar? Talvez para Heráclito, a base da vida seja como o correr das águas de um rio: apenas tudo deva mudar constantemente. Porém, para o filósofo polonês Zygumnt Bauman, pode-se categorizar essa sensação com algumas expressões: sociedade e amor líquidos. Quando se trata do nicho das redes sociais e cultura de descarte em massa, entende-se que a ideia central do escritor se fundamenta em um amor “que escorre por entre os dedos”: consequência de relações superficiais que proporcionam laços descartáveis.
Assim, no contexto de uma sociedade pós modernidade globalizada, existe uma busca inconsciente pela gratificação imediata e validação pessoal. Essa felicidade líquida, portanto, deve ser atestada pelos outros – sendo esse, portanto, um dos principais defeitos encontrados e abordados por Bauman. Mas se o posicionamento proposto se assemelha a uma crítica ao amor, existe uma lacuna por entre o espaçamento das palavras: justamente por ser uma necessidade fundamental do ser humano, deve-se haver mais discussões sobre o tema fora da utopia proposta pelo entretenimento de massa.
Madame Bovary e o “como eu quero” do Kid Abelha
O termo “Bovarismo” é de teor psicológico utilizado para designar pessoas que não se satisfazem com a realidade em que estão inseridos ou coisas que possuem, constantemente idealizando e comparando com outras naturezas – situação que se adapta, também, a relacionamentos. O termo foi inspirado pela célebre personagem Emma Bovary, que entendia como seu conceito de amor, tudo aquilo que absorvia dos livros de romance que lia quando adolescente: um amor avassalador, inconstante e, acima de tudo, fictício – afinal, sua função comercial é entreter o leito e se vender a partir disso. Já era de se esperar que, ao comprometer-se em um relacionamento, Bovary cai na rotina, assim como sua imaginação e expectativas.
E se “Madame Bovary”, de 1856, expõe essa problemática como característica pertinente ao ser humano, entende-se que a raiz do problema esconde-se muito além da nossa realidade. Dessa maneira, não se pode culpar o momento social em que estamos inseridos pelo modo que nos relacionamos; ao mesmo tempo, não é possível escapar dele, cabendo a nós, imponentemente, entendê-lo e adequar nossas expectativas e idealizações aquilo que nos é ofertado – não aquilo que é vendido como fórmula mágica e exigência para a felicidade.