quarta-feira, 8 de outubro de 2025

A geração de homens que vai morrer sozinha

    Você já ouviu a frase: “tinha que ser mulher"? Eu ouvi desde cedo, como se ser uma mulher fosse um pecado diário. Mas o curioso é que hoje, quem se perde nesse jogo não somos nós. São eles.


    As mulheres mudaram. Estudam mais, trabalham mais, sustentam suas casas e decidem seus caminhos, e isso não é detalhe, é revolução cotidiana. No Brasil, mais de 60% das pessoas que concluem o ensino superior são mulheres (IBGE, 2022), que conquistaram espaço em áreas antes negadas e, ao fazer isso, transformaram as relações de poder. Enquanto isso, muitos homens ainda acreditam que basta repetir o roteiro antigo para garantir respeito, amor ou companhia, porém, esse script não funciona mais.

    Pierre Bourdieu chamava isso de dominação masculina: um sistema invisível que define quem manda, quem cala, quem cuida e quem decide. Por muito tempo, os homens foram o centro dessa engrenagem, mas quando as mulheres começaram a desafiar essas regras, a estrutura inteira tremeu. Dessa forma, muitos homens se descobriram frágeis, sem saber quem são fora do papel de provedores ou de centro da relação.

    O problema é que eles nunca praticaram se relacionar de verdade, pois aprenderam a desejar mulheres, mas não a conviver com elas. Quantos homens você conhece que conseguem ouvir sem interromper? Que aceitam um “não” sem transformar em disputa? Que enxergam uma parceira como igual, e não como alguém que deve girar ao redor deles? Essa incapacidade emocional não é detalhe, é a raiz da solidão masculina, alimentada por uma cultura que ensina a conquistar, não a se conectar. Basta lembrar de American Pie, em que o objetivo é “pegar” alguém, nunca compreender, ao passo em que alimentam essa narrativa desde cedo, aprendendo a ver o afeto como vitória e a vulnerabilidade como fraqueza. Ao fim, crescem assim, com medo de se abrir, acreditando que sentir é perder o controle.

    E há um ponto raramente dito: muitos homens heterossexuais se aproximam de mulheres não por desejo genuíno, mas porque a sociedade exige, pois ter uma parceira funciona como um carimbo de status. O problema é que laços formados pela obrigação, e não pelo afeto, acabam superficiais, formando relações rasas que não resistem em um mundo em que as mulheres não dependem mais de ninguém para existir.

    Esse quadro se soma à homossociabilidade masculina, ou seja, a intimidade e o afeto que os homens compartilham entre si, mas disfarçados de “irmandade”. Se abraçam, dividem dores, cuidam uns dos outros, mas evitam chamar isso de carinho, como se o afeto fosse permitido, mas apenas se não for com uma mulher. O resultado é paradoxal, sendo observado, em muitos casos, a relação emocional mais forte de um homem presente nos amigos, não na parceira.

    Isso explica por que tantos reclamam de solidão. Não é falta de mulheres, é falta de preparo emocional, logo, incapacidade de lidar com relações em pé de igualdade, resultando em um medo de perder o lugar de centro, sem perceber que esse lugar já não existe. Sob essa visão, os números confirmam: homens jovens relatam cada vez mais dificuldade em criar vínculos sérios (Pew Research Center, 2023, EUA), e no Brasil, eles também lideram estatísticas de depressão e suicídio: 75% dos casos registrados são masculinos (Ministério da Saúde, 2021). Isso não é coincidência, é resultado de um modelo de masculinidade que isola, endurece e, no fim, adoece.

    Enquanto isso, as mulheres seguem criando redes, cuidando umas das outras, sustentando seus próprios caminhos. Quem não acompanhar essa mudança ficará sozinho, não por azar, mas por consequência.