segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Literatura de Cordel

A literatura de cordel chegou na península Ibérica, Espanha e Portugal, por volta do século XVI. Recebeu esse nome característico, cordel, por ser pendurada em cordões ou vendidos estendidos no chão de mercados populares.
O gênero chegou ao Brasil com os colonizadores portugueses e se difundiu no nordeste, por se encontrar nesta região a capital do país na época, Salvador, com isso é mais frequente nesta localidade. O cordel também contém autores de outras regiões, mas com menor frequência.
            O cordel é impresso em folhetos ilustrados por xilografia, técnica pela qual se cria um molde entalhado na madeira em alto revelo um desenho.

Depois, com auxílio de tintas, o desenho é gravado nos folhetos. Os livrinhos possuem poucas páginas e geralmente são vendidos pelos próprios escritores. É conhecido como poema popular, vendido a pequenos preços o que ajuda a popularização dos cordéis.
Os assuntos tratados nas obras abrange o cotidiano, vagando entre a seca do sertão, questões sociais, festas, vida de cangaço ou histórias românticas.
            O Brasil possui desde 1988 uma Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC) criada no Rio de Janeiro, a instituição ajudou a difundir o cordel para outras partes do país. Hoje a Academia realiza projetos promovendo encontros entre autores, organizando premiações, entre outros. Atualmente a Academia contém 40 cadeiras para compor o corpo acadêmico com cargo efetivo.
Entre os autores da literatura de cordel temos: Apolônio Alves dos Santos, Cego Aderaldo, Firmino Teixeira do Amaral, João Martins de Athayde, entre outros. Os autores já citados são consagrados nessa literatura contendo muitas histórias de cordel conhecidas.

Discussão do Carioca com o Pau-de-Arara – Apolônio Alves dos Santos

Já que sou simples poeta 
poesia é meu escudo 
com ela é que me defendo 
já que não tive outro estudo 
vou mostrar para o leitor 
que o poeta escritor 
vive pesquisando tudo                                              

Certo dia feriado 
sendo o primeiro do mês       
fui tomar uma cerveja 
no bar de um português 
lá assisti uma cena 
agora pego na pena 
para contar pra vocês
Quando eu estava sentado 
chegou nessa ocasião 
um velho pernambucano 
daqueles lá do sertão 
com a maior ligeireza 
foi se sentando na mesa 
pediu uma refeição
O português logo trouxe 
um prato grande sortido 
o nortista vendo aquilo 
ficou logo enfurecido 
com um gesto carrancudo 
começou mexendo tudo 
depois falou constrangido
Patrício não leve a mal 
nem me queira achar ruim 
toda espécie de comida 
que você tem é assim? 
desculpe minha expressão 
mas a sua refeição 
não vai servir para mim
Nesta hora o português 
ficou zangado também 
lhe respondeu ora bola 
donde é que você vem? 
difamando deste jeito 
me diga qual o defeito 
que esta comida tem?                                   
O nortista disse eu sofro 
um ataque entistinal 
a carne está quase podre 
o arroz tem muito sal 
o feijão está azedo 
de comer eu tenho medo 
que pode me fazer mal
— O meu estômago não dá 
pra receber este entulho 
prefiro morrer de fome 
mas não como este basculho 
pois comendo sei que morro 
lá no norte nem cachorro 
não come todo bagulho
O português respondeu 
você é péssimo freguês 
vá embora e faz favor 
não vir aqui outra vez 
mas antes tem que pagar 
não posso lhe perdoar 
a desfeita que me fez
O nortista disse eu pago 
que isto não me embaraça 
para você não pensar 
que eu vim comer de graça 
mas o nortista de nome 
embora morra de fome 
mas não come esta desgraça
Acontece que ali 
se achava um carioca 
disse ele só conhece 
farinha de mandioca 
todo nortista poeira 
só gosta de macacheira 
girimum e tapioca
Disse o nortista é porisso 
que o nordestino é forçoso 
porque no meu velho norte 
se come pirão gostoso 
com farinha de mandioca 
aqui só dá carioca 
doente tuberculoso
C. — Respondeu o carioca 
não queira tanto agravar 
seu nordeste é muito bom 
mas lá ninguém quer ficar 
deixou lá seu pé de serra 
e veio pra minha terra 
para poder escapar
N. — Aqui também me pertence 
o nortista respondeu 
eu sou nato brasileiro 
o Brasil é todo meu 
o homem precisa andar 
para poder desfrutar 
do país onde nasceu
C. — O carioca rompeu 
nordestino é curioso 
além de ter olho grande 
é demais ambicioso 
chega aqui se amaloca 
na terra do carioca 
doente tuberculoso
N. — Disse o nortista é porque 
nosso Rio de Janeiro 
precisa do nordestino 
pois é um povo ordeiro 
pra quem derrama suor 
aqui no Rio é melhor 
para se ganhar dinheiro
C. — Mas no Rio de Janeiro 
tem operário de sobra 
não precisa nordestino 
vir aqui fazer manobra 
nordestino é atrevido 
aqui já é conhecido 
por camondonga de obra
N. — Você me diz isso tudo 
pra me desclassificar 
mas aqui as companhias 
preferem mais empregar 
os nordestinos que vem 
pois carioca não tem 
coragem de trabalhar
C. — É porque o carioca 
gosta da civilidade 
não é defeito ninguém 
viver da facilidade 
pois ninguém não é cavalo 
pra viver criando calo 
sem haver necessidade
N. — O carioca só gosta 
de viver da malandragem 
do jogo e da bebedeira 
do vício e da vadiagem 
porisso o país da gente 
não pode ir para a frente 
por causa da pilantragem
C. — O carioca está certo 
pensando assim pensa bem 
o carioca não gosta 
de ser sujeito a ninguém 
nem dá valor a operário 
que só vive do salário 
luta muito e nada tem
N. — Já eu penso diferente 
você precisa entender 
que nosso mundo é composto 
de tudo precisa ter 
se não fosse o operário 
o rico milionário 
como podia viver?
C. — Mas o nortista trabalha 
porque é muito uzurario 
tem alguém que vem pra qui 
mas lá é proprietário 
pois devido a ambição 
enfrenta até fundação 
com os olhos no salário
N. — É porque o nordestino 
é um homem acostumado 
a só viver do trabalho 
não ignora o pesado 
não é como o carioca 
que só vive da fofoca 
da malandragem e do fado
C. — Tinha graça o carioca 
se misturar com cimento 
como faz o nordestino 
que chega ficar cinzento 
carioca só procura 
um emprego que figura 
moral e comportamento
N. — Não é todo carioca 
que tem a capacidade 
de assumir um emprego 
de alta dignidade 
precisa de estudar 
para assumir um lugar 
de responsabilidade
C. — Você aí está certo 
o estudo está na frente 
porque o mundo ficou 
para o mais inteligente 
assim diz quem for ativo 
o operário é cativo 
num país independente
N. — Pois eu gosto do trabalho 
e vivo sempre disposto 
pois o homem que trabalha 
a Jesus dá grande gosto 
porque Deus disse a Adão 
hás de ganhar o teu pão 
com o suor do teu rosto
C. — Então você é Adão 
que veio do paraíso 
faça lá o que quiser 
que de você não preciso 
nem vou na sua maloca 
porque sou um carioca 
que honro o chão onde piso
N. — Nem de você eu preciso 
que você é fracassado 
pelos traços já se vê 
que você é pé rapado 
e quem fala deste jeito 
só pode ser um sujeito 
ignorante atrasado
C. — Disse o carioca eu vivo 
com minha alma tristonha 
vou embora para onde 
o nordestino nem sonha 
vou esconder minha cara 
para este pau-de-arara 
não me matar de vergonha
FIM 

Referências: 

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