sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

A culpa talvez seja das estrelas: Natal em 25 de dezembro

As estrelas, o Sol, a Lua, as estações do ano. Imagine um ser racional que está tentando entender o mundo ao seu redor. Quando este ser vê tais eventos, fenômenos e aparições tão magnificamente fora de seu controle, como não os entenderia como divinos?

Por muito tempo, fenômenos astronômicos eram uma das maiores inspirações para o entendimento do mundo. 

Era muito natural que usássemos nossa capacidade de reconhecer padrões para formar pontos entre estrelas, criando personagens e mitos astrais. 

Ora, a posição dessas constelações ou dos astros coincidiam com a mudança das estações, com a altura da maré. Estava claro que o celeste era o livro dos deuses e da natureza.

Assim, entende-se a possível base astrológica/astronômica comum das religiões antigas e atuais.

A data escolhida para se comemorar o nascimento de Jesus Cristo pode fazer parte dessa tradição de observação do céu e seus astros. Adotando os costumes de diversas culturas em se celebrar a vitória do sol, a luz e o verão, sobre as trevas, o frio e o inverno, antigos cristãos começaram a celebrar nessa mesma data o nascimento de Jesus Cristo, como aponta o controvertido filme Zeitgeist.

O solstício de inverno no hemisfério norte é quase sempre no dia 21 ou 22 de dezembro, é quando o Sol aparenta estar "morrendo", por causa dos dias cada vez mais curtos e temperaturas mais baixas. Depois de três dias do solstício, o Sol começa a renascer e retomar seu poder: lentamente as noites vão encurtando e os dias vão alongando. A páscoa está relacionada com o equinócio de primavera, marcando a vitória da luz sobre as trevas, pois a partir daí, os dias são mais longos que as noites.

Para nós, no hemisfério sul, assim como as estações do ano, os solstícios e equinócios são invertidos, portanto, em dezembro, passamos pelo solstício de verão e muitos observam que, do ponto de vista astronômico, deveríamos comemorar o Natal em...junho!

No final, é possível entendermos como a posição aparente e o relacionamento arbitrário entre objetos a distâncias quase infinitas podem determinar a cultura, a história e as crenças de nós aqui no pálido ponto azul. Talvez, nesse sentido, exista, sim, um mecanismo pelo qual aconteça alguma influência dos astros sobre nossas vidas.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

Minissérie: A língua inglesa na fala jovem brasileira II - Entrevista

   

Voltando ao tema do uso do inglês na linguagem informal e tecnológica, fizemos uma entrevista com Luiz Felipe Cabral de Souza, estudante do IFSP Salto.

- Você diria que, no seu cotidiano, usa uma linguagem mais formal ou informal?

“Depende do local e das pessoas. Se estou com meus amigos, minha linguagem tem formalidade zero. Mas quando a situação é mais formal, estou falando com alguém mais velho ou uma autoridade, costumo aumentar o nível do meu português, ‘upgradá-lo’.”

- Usar uma linguagem informal ajuda na fluidez da conversa com seus amigos?

“Se o meu amigo já está acostumado com a minha linguagem, ajuda muito, as minhas gírias com certeza são algo benéfico. Isso até muda a aura da conversa, vira outro ‘hype’, até deixa mais interessante e descontraído.”

- Você usou várias palavras do inglês agora comigo. Eu também com certeza uso, principalmente no contexto informal. Você também costuma usar palavras do inglês na sua linguagem informal? Se sim, de onde acha que vem essa influência?

“Sim, eu uso bastante. Isso vem muito dos jogos, da mídia que eu consumo. Querendo ou não, o inglês é a língua principal do mundo, a gente acaba absorvendo essa influência. O brasileiro é muito bom em adaptar as coisas, e a gente adapta esse vocabulário também.”

- Esse ponto é interessante, você acha que a gente muda as palavras que vem da gringa? Mudamos o som, o formato, etc?

“Com certeza. A gente pega essas palavras do inglês e aproxima elas, pra ficar mais fácil de falar e também pra dar outro sentido, deixando aquilo mais fácil de entender.”

- Pode dar um exemplo de alguma palavra do inglês que você usa bastante?

“Sim, um bom exemplo é ‘spoiler’. A gente usa muito no sentido original de entregar os acontecimentos de um filme, só que em alguns contextos a gente muda muito essa palavra. Por exemplo, quando alguém te dá um 'spoiler', você fala ‘não, para de me spoilar’. “

- Ao usar essas palavras, você observa uma mudança ou ampliação do significado?

“Se a gente pega a palavra, a gente quer usar o significado. Pode haver mudança no significado sim, mas normalmente ainda tem alguma relação. Em jogos, quando você fica muito tempo jogando e coletando recursos, você fala que tá ‘gridando’’. Mas fora dos jogos, eu posso falar vou 'grindar' aquela série. Mesmo que mudou a situação, de alguma forma ainda tem uma semelhança no significado.“

- Mas talvez vá para além da fala informal, você é da área de informática. Você acha que também há essa influência em contextos técnicos na área da tecnologia?

“Sim. Às vezes até tem algum termo mais correto, mas o termo em inglês é mais usado. Na programação a gente fala, para mostrar algo numa tela, ‘printar’, ‘printei isso ou aquilo’.”

- E por que o inglês tem tanta influência na tecnologia?

“Porque muita coisa da área vem dos EUA ou de outros países que usam o inglês como padrão por causa da influência americana”.

Percebemos como, de fato, o inglês é influente no contexto informal e também no técnico. Realmente, esse impacto linguístico tem muito haver com o poder dos países anglófonos como a Inglaterra e os EUA no cenário geopolítico mundial. É interessante também como nós adaptamos a palavra por completo, alterando aspectos como: pronúncia, morfologia e até a classe da palavra.

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Meu querido urso amigo


Com certeza, todos já tiveram — ou ainda têm — aquela pelúcia ou brinquedo favorito que nos defendia dos monstros escondidos debaixo da cama. Aqueles que nos traziam conforto e nos ajudavam em momentos de euforia ou tristeza.


Esses objetos inanimados, chamados “objetos transicionais”, têm uma função muito importante no nosso desenvolvimento afetivo e nos ajudam a assimilar o desenvolvimento humano, a desenvolver e preservar as relações conforme amadurecemos.


Quem prestou atenção na função desses “objetos especiais” foi o pediatra e psicanalista inglês Winnicott, ele elaborou uma teoria em que estas transformações, além da escolha específica do objeto, indicavam a capacidade de criação da criança, elegendo, inventando e trabalhando sua imaginação, assim, iniciando um apego em relação ao objeto. Ele incorporou na Psicanálise o termo “transicional” para designar uma área intermediária da experiência, um espaço onde as realidades interna e externa do bebê se tocam e separam o interior do exterior. O objeto transicional seria, assim, uma espécie de mediador entre mãe e filho, entre mundo interno e mundo externo ou, em outros termos, a área de encontro entre o “eu” e o “não-eu”.


Com relação à vida adulta, o psicólogo Robert Ryan, afirma que o fato de adultos ainda dormirem com pelúcias pode ajudar a lidarem com medos existenciais, ou até mesmo pode ser um sinal de solidão. 


Dormir com nossos queridinhos, não é necessariamente um sinal ruim, desde que isso não interfira negativamente na sua vida pessoal, como por exemplo, dificultando seus relacionamentos com pessoas humanas.


Afinal, como “objetos transicionais”, os bichinhos podem nos preparar para relacionamentos com gente como a gente.


Para saber mais:

Donald Winnicot:

Winnicot, D. A criança e o seu mundo. Rio de Janeiro, LTC, 2021.

Entrevista com Robert Ryan:

https://www.vice.com/en/article/evgkqw/how-old-is-too-old-to-sleep-with-a-stuffed-animal



 

sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

Minissérie: A música é uma linguagem II - trilha sonora

 

No último episódio da minissérie, expliquei porque considero a música uma linguagem.

Desta vez, vamos entender um pouco melhor como a música funciona como pedra fundamental de expressão na forma de trilhas sonoras.

Especificamente, vamos entender um pouco sobre como funcionam os temas musicais empregados em filmes e séries.

Quando ouvimos um tema, ou seja, uma música ou ideia musical, que se repete em uma trilha sonora, há uma grande chance dele ser um leitmotiv

Um leitmotiv é um tema que representa um personagem, lugar na história, objeto ou qualquer outro ente relevante na narrativa.

Existem várias características importantes comumente presentes nos leitmotivs. A primeira é que eles se repetem durante a trilha, aparecem várias vezes. 

Outra é que eles são associados a um elemento específico, não mudam a coisa que estão representando ao decorrer da trilha.

Por último, eles se transformam de acordo com o que representam se transforma. Isso é importante pois é um desdobramento da essência de um leitmotiv e da trilha sonora de uma obra.

O intuito da trilha e de seus temas é refletir a história, contar, ou complementar, intensificar, o que a obra conta. 

Um adorável exemplo da aplicação dessa técnica temática é o que acontece com o tema do fofíssimo dragão Banguela de Como Treinar o Seu Dragão. 

Quando o personagem aparece de perto pela primeira vez, ele faz parte do desconhecido na visão do protagonista Soluço, é o que ao garoto causa medo, o que deve ser combatido ou evitado. Assim, o tema do dragão é apresentado de forma que nos passa uma tensão muito maior (ouça aqui, note a melodia em gaitas de foles a partir que começa aos 2 min 30 s). 

Agora, quando a história progride e Banguela vai se tornando o melhor amigo do protagonista, o tema reflete essa transformação e, progressivamente, evolui para a sua versão mais intensa, totalmente desenvolvida (ouça aqui, note o que eu acredito ser uma celesta ou um glockenspiel aos 3 min 4 s e ouça aqui a versão mais desenvolvida e dramática do tema no segundos iniciais).

Esse é apenas um de incontáveis exemplos. Talvez seja um exercício interessante que prestemos mais atenção a essas nuances dos temas dos filmes e seriados que amamos tanto. Às vezes, uma simples melodia vale mais do que mil palavras.